- Equipe SEFRAS - Ação Social Franciscana
Trabalho Infantil – “Pequenas Mãos privadas de dignidade”
A frase “pequenas mãos privadas de dignidade” é do Papa Francisco que enviou uma mensagem para a 5ª Conferência Global de Erradicação do Trabalho Infantil que foi realizada na África do Sul, em Maio desse ano, para tratar sobre a eliminação da exploração do trabalho crianças e adolescentes.

O Brasil apresenta um cenário preocupante frente ao trabalho infantil e que se agravou ainda mais nos últimos anos com falta de políticas públicas efetivas para as crianças e suas famílias, e que se aprofundou com a chegada da Pandemia de COVID-19, em 2020.
Algumas formas mais comuns de trabalho infantil no país são: trabalho doméstico, trabalho nos campos, trabalho nas ruas, trabalhos perigosos e insalubres, e exploração sexual – uma violência comum na qual crianças e adolescentes são utilizados para fins sexuais em troca de dinheiro, presentes ou favores.
De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua) sobre Trabalho de Crianças e Adolescentes, em 2019, havia 1,768 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil, o que representa 4,6% da população nesta faixa etária. A maior concentração de trabalho infantil está na faixa etária entre 14 e 17 anos, representando 78,7% do total. Já a faixa de cinco a 13 anos representa 21,3% das crianças exploradas pelo trabalho infantil.
Segundo o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), o número de crianças e adolescentes negros em situação de trabalho é maior do que o de não negros. Os pretos ou pardos representam 66,1% das vítimas do trabalho infantil no país.
Estes dados são subnotificados pois o Brasil não tem controle sobre diversas realidades. A falta de dados apresenta a falta de controle e de planejamento para o enfrentamento desta situação encontrada na vida de milhares de brasileirinhos e brasileirinhas. Com a Pandemia sabemos que estes dados hoje são bem maiores e mais drásticos. É perceptível o aumento de crianças em situação de rua e em atividades de vendas nos semáforos ou em trabalho informais que competem com a frequência na escola.

No entanto, não podemos analisar e debater sobre este contexto de violação de direitos, sem considerar outros fatores e políticas públicas necessárias para sanar tal problema. “A pobreza é a mãe de toda a exploração. A miséria que acompanha a ausência de proteção dos direitos elementares é o abismo em que caem milhões de pessoas todos os anos, começando por aquelas que não sabem se defender, meninas e meninos, e se encontram “arando os campos, trabalhando nas minas, percorrendo grandes distâncias para tirar água e realizando trabalhos que os impedem de frequentar a escola, sem falar do crime da prostituição infantil.” Escreve o Papa Francisco na mensagem enviada à Organização Mundial do Trabalho (OIT), citando as situações dramáticas vividas por “milhões de meninas e meninos” condenados “a uma vida de empobrecimento econômico e cultural”.
Nos últimos anos, com medidas de retrocessos tanto do Governo Federal como do Parlamento, aprofundam um contexto perverso e desigual para maioria das famílias brasileiras, exemplo com a PEC do “Teto de Gastos”, que reduziu o orçamento para o acesso a políticas fundamentais de educação, saúde e alimentação. Já a reforma trabalhista precarizou a rotina de sobrevivência das famílias e das condições de cuidado frente aos seus filhos e filhas.
Com a crise humanitária e econômica decorrente da Pandemia de COVID-19, houve o agravamento da desigualdade e logo do trabalho infantil no Brasil. Um estudo realizado pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) revelou que o número de crianças em situação de trabalho infantil aumentou 26% entre os meses de maio e julho de 2020 em São Paulo. De acordo com o estudo lançado em agosto de 2020, as crianças estão fora da escola e muitas delas não tinham acesso à internet para acompanhar as aulas online durante o período de isolamento. Outro aspecto percebido pelo órgão durante a realização da pesquisa foi a segurança alimentar, uma vez que muitas crianças dependem exclusivamente das refeições oferecidas nas escolas.
Dados sobre a fome, o recém-publicado Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, revela que o país duplicou o número de pessoas que passam fome em menos de dois anos. No fim de 2020, 19 milhões de brasileiros conviviam com a fome. Em 2022, são 33 milhões de pessoas sem ter o que comer.
Enquanto a segurança alimentar está presente em 53% dos domicílios onde a pessoa de referência se autodeclara branca, nos lares com responsáveis de cor preta ou parda ela cai para 35%. Em outras palavras, 65% dos lares comandados por pessoas pretas e pardas convivem com restrição de alimentos. Ou seja, famílias negras são as mais impactadas, assim como em outros indicadores sociais.
A fome dobrou nas famílias com crianças menores de 10 anos, passando de 9,4% em 2020 para 18,1% em 2022. Na presença de três ou mais pessoas com até 18 anos de idade no grupo familiar, a fome atinge 25,7% dos lares. Já nos domicílios apenas com moradores adultos a segurança alimentar chegou a 47,4%, número maior do que a média nacional. A fome é mais um retrato de um país que viola os direitos humanos de crianças e adolescentes diariamente.

Precisamos aproveitar estas agendas de mobilização sobre os direitos humanos de crianças e adolescentes para fortalecer espaços de construção de um Projeto de País, que invista de forma estratégica e programática em políticas preventivas e afirmativas para a superação da desigualdade social e econômica, que assola a maioria do povo brasileiro, em especial negros e de territórios periféricos.
Estamos num ano eleitoral e as pessoas devem assumir as urnas como instrumento democrático e de efetivação da prioridade frente a todas as formas de vida, em especial daquelas que exigem prioridade absoluta frente às prioridades.
Diante desta perspectiva política, o Fórum PETI, ressalta algumas ações urgentes e necessárias para o enfrentamento deste contexto complexo:
Adoção urgente de uma política de renda básica universal para as famílias em situação de vulnerabilidade social;
Fortalecimento das políticas de alimentação escolar nos Estados e municípios como forma de garantir a segurança alimentar e nutricional das crianças, adolescentes e suas famílias;
Adoção urgente de uma política de renda básica universal para as famílias em situação de vulnerabilidade social;
Incidência política forte no Legislativo, Executivo e Judiciário locais para que as ações de enfrentamento à COVID-19 contemplem as crianças e os adolescentes no trabalho infantil e os adolescentes em Aprendizagem Profissional.
É importante também destacar que a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou por unanimidade uma resolução declarando 2021 como o Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil. Essa iniciativa é uma forma de estimular os países a se mobilizarem para o alcance da meta 8.7 dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que trata da eliminação de todas as formas de trabalho infantil até 2025.
Tanto meninas quanto meninos submetidos à situação de trabalho precoce frequentemente têm outros direitos essenciais negligenciados, como o direito à educação, à saúde e ao lazer. Neste 12 de junho, dia “Dia do Combate ao Trabalho Infantil”, queremos reforçar a importância de sensibilizar toda a sociedade a enfrentar o trabalho infantil e unir todos os setores para proteger crianças e adolescentes contra essa grave violação de direitos humanos. Então, caso presencie qualquer situação de trabalho infantil, incluindo a exploração sexual, denuncie! Disque 100, entre em contato com qualquer um dos canais oficiais de denúncia de violações de direitos de crianças e adolescentes ou denuncie diretamente ao Ministério Público do Trabalho.
Num país onde o desemprego, a falta de moradia, educação de qualidade, e onde grande parte da população luta diariamente por uma refeição, precisamos repactuar princípios societários e democráticos, mas antes de tudo fazer controle e se mobilizar para que nenhuma criança fique para trás, de sua dignidade e viva integralmente a sua condição peculiar de desenvolvimento: com tempo e espaço para brincar, aprender e ser feliz. Livre de qualquer forma de abuso, violência, violação ou exploração.